As pesquisas mais abrangentes sobre o impacto da inteligência artificial no mercado de trabalho geralmente avaliam cenários em países ricos. Um estudo inédito da Organização Mundial do Trabalho (OIT) publicado na semana passada, no entanto, procura preencher a lacuna sobre o que poderia acontecer aos trabalhadores latino-americanos.
A pesquisa indica que 37% dos empregos no Brasil estão expostos à inteligência artificial generativa, o que significa que essa parcela poderá sofrer mudanças significativas na forma de trabalhar. O percentual (equivalente a 37 milhões de empregos) é um dos mais elevados dos países analisados na América Latina e no Caribe, atrás apenas da Costa Rica.
Este grupo inclui empregos que podem ser substituídos (minoritários), aqueles que tendem a ganhar produtividade com o uso da IA e uma parcela para a qual os efeitos da tecnologia ainda são incertos.
O perfil das mulheres, dos jovens, que vivem em áreas urbanas e possuem nível de escolaridade médio a alto são os mais expostos à substituição pela IA. No Brasil, o percentual de risco de automação é duas vezes maior para as mulheres do que para os homens, aponta a OIT.
O padrão brasileiro segue o da média dos países da região em termos de diferença de gênero e, segundo a organização, isso acontece porque as mulheres estão concentradas em setores mais vulneráveis, como administração, finanças, seguros e funções no setor público.
A proporção de pessoas que podem perder os seus empregos devido a robôs automatizados, contudo, é menor na América Latina e nas Caraíbas do que nas regiões mais ricas do planeta. Segundo a OIT, fica entre 2% e 5%, dependendo do país (no Brasil, é de 2%).
Uma das razões para isso é a menor presença de infraestrutura digital, que serve como “amortecedor temporário” contra a automação de algumas posições.
A investigação também admite um grau relevante de incerteza para a maioria dos trabalhadores expostos à IA. No Brasil, 22% estão em uma categoria definida como “grande incerteza”. Segundo economistas da OIT, a categoria é formada por profissões que, dependendo do progresso da tecnologia, podem se aproximar do risco da automação ou dos ganhos da IA.
Ganhos de produtividade limitados
O estudo também indica que há potencial de ganhos de produtividade para 8% a 14% dos trabalhadores da região da América Latina e Caribe com a adoção da IA, percentual que é de 13% no Brasil. O perfil mais beneficiado são os profissionais com maior renda, maior escolaridade e vaga formal.
A Organização Internacional do Trabalho salienta que, com a IA, os países da região teriam a oportunidade de reduzir a histórica baixa disparidade de produtividade nas suas economias.
O potencial de ganhos, no entanto, tende a ser limitado. Quase metade das profissões que poderiam beneficiar são dificultadas por deficiências digitais que deverão impedi-las de o fazer. Os economistas da OIT estimam que existam cerca de 17 milhões de empregos em 16 países da América Latina e das Caraíbas que poderiam beneficiar da IA, mas que não se espera que colham os benefícios da tecnologia.
Infraestruturas inadequadas, menos acesso à tecnologia, custos associados à utilização da IA, baixo capital humano e desigualdade digital são alguns dos fatores que limitam os benefícios da inteligência artificial na região.
Numa comparação entre onze regiões do mundo, a taxa média de trabalhadores que podem ganhar com a IA só é mais elevada na América Latina e nas Caraíbas (12,8%) do que no Sul da Ásia (11,9%) e na África Subsariana (10,1%) . No Brasil, esse percentual é de 13%.
Proteções sociais reforçadas
Estudos realizados em países desenvolvidos indicaram o risco de aumento da desigualdade entre grupos demográficos beneficiários da tecnologia e aqueles mais expostos à automação (como as mulheres).
“Nesse sentido, o impacto distributivo da adoção da IA depende fortemente de como os efeitos do aumento da eficiência e da produção podem superar a substituição de trabalhadores pela tecnologia”, aponta o relatório.
Além de melhorar as infraestruturas digitais, a OIT sugere políticas para implementar programas de aprendizagem contínua para os trabalhadores, melhorias nos sistemas de proteção social e políticas que visam grupos mais vulneráveis, como as que abordam questões de género.
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