Quando Charles Darwin embarcou no HMS Beagle para fazer parte da expedição topográfica que desembarcou em diversos pontos da América do Sul, Austrália e África, ele não tinha ideia do impacto que sua pesquisa poderia ter na forma como a humanidade concebe e vê os fenômenos naturais. . A publicação de A Origem das Espécies trouxe ao mundo o conceito de que, ao longo do tempo, as espécies se adaptam a novos ambientes como forma de garantir a sua sobrevivência e perpetuação.
Esta necessidade de adaptação constante às novas condições é um dos elementos que impulsiona a procura de novas soluções para situações potencialmente problemáticas. Em algum momento do passado, o homem compreendeu que a ajuda da força animal lhe permitia realizar o trabalho de forma mais qualificada; Quando descobriu o fogo, não precisou mais temer as noites frias e escuras e pôde, a partir do calor, produzir novos materiais. Com o tempo, o fogo revelou-se uma fonte de calor essencial para a movimentação de máquinas, tornando o seu trabalho mais rápido e eficiente.
A humanidade evoluiu e as necessidades, consequentemente, mudaram, o que impôs uma busca constante por novas formas de obter energia para realizar atividades cotidianas. Encurtando o caminho em alguns milhares de anos, entre a Era do Fogo e a era contemporânea, passando pela Revolução Industrial, o mundo já viveu diversas transições energéticas e urge uma ainda mais grave, que permita a substituição drástica de fontes de energia fósseis – principais responsáveis pelo aquecimento global devido à emissão de dióxido de carbono – provenientes de fontes renováveis e com menores impactos ao meio ambiente.
Como toda mudança de comportamento enfrenta barreiras, a adoção de novas medidas também exige uma dose de conhecimento sobre o comportamento humanoespecialmente os mecanismos económicos que encorajam mudanças: os indivíduos respondem aos incentivos e só estarão dispostos a adoptar novas medidas se estas tiverem o potencial de trazer benefícios tangíveis (e rentáveis).
Até este ponto da sua leitura, a primeira – e óbvia – solução que deve ter passado pela sua cabeça deve ter sido que uma forma de estimular esta nova transição seria aumentar o incentivos para a indústria automobilística: Agora, ao aumentar o número de veículos elétricos, o número de veículos a combustão consequentemente diminui. Se dermos um passo atrás, veremos que a ideia de “transição energética” envolve – e exige – muito mais do que isso para trazer os benefícios esperados.
Em 2024, o governo federal lançou o “Plano Nacional de Transição Energética”, que envolve uma série de medidas e programas de incentivo, em diferentes setores da economia, que visam criar um ambiente que incentive a busca por alternativas para substituir os combustíveis fósseis. Recentemente, o Ministério dos Transportes publicou a Portaria nº 689/2024, trazendo critérios para classificação de projetos de investimentos como prioritários para emissão de debêntures incentivadas e de infraestrutura – um deles é justamente a previsão de investimentos em “mitigação de emissões de gases de efeito estufa, efeito estufa, transição energética ou implementação e adaptação de infraestruturas para a resiliência climática, com vista à adaptação às alterações climáticas”.
Ampliando ainda mais a visão, é possível verificar esse esforço em outros setores como forma de contribuir para esse equilíbrio. No Estado de São Paulo, os contratos de concessão rodoviária mais recentemente publicados pela Artesp estabelecem que uma das obrigações da concessionária é o dever de inventariar todos os ativos geradores de GEE (gases de efeito estufa) e apresentar a lista juntamente com o Relatório Anual de Desempenho Ambiental. Estão também previstas medidas para compensação de emissões de gases nas atividades de operação do sistema, como utilização de veículos híbridos/elétricos, incorporação de ações ambientais mitigadoras, entre outras, e obrigatoriedade de obtenção de certificado de neutralização de emissões de GEE nas operações realizadas a cada cinco anos.
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) tem o programa Aeroportos Sustentáveis, instrumento de incentivo não regulatório que visa incentivar e difundir boas práticas na gestão ambiental dos aeroportos, com o reconhecimento de iniciativas que visem a implementação de mecanismos mais sustentáveis nas operações aéreas. Em 2023, o Aeroporto de Confins foi reconhecido como o primeiro aeroporto neutro em emissões de gases de efeito estufa do país, graças à adoção de medidas que vão desde a substituição de lâmpadas e sistemas de ar condicionado até a substituição da fonte de energia que alimenta os aviões na pista.
Até agora falamos apenas das obrigações previstas no contrato, para as quais há penalidade em caso de descumprimento; e em programas voluntários, como o promovido pela Anac, que não impacta diretamente no contrato de concessão. Mas esta agenda pode ser ampliada para incentivar o estudo de projetos que prevejam o possibilidade de contratos fornecerem mecanismos de incentivo para concessionárias que atinjam determinadas metas de redução de emissões de gases.
Isso já é uma realidade em determinadas formas de contratação com a Administração Pública: a “nova” Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021), por exemplo, prevê no artigo 144 a possibilidade de inclusão de remuneração na contratação de obras, fornecimentos e Serviços. variáveis ligadas ao desempenho do contratante, com base em metas, critérios de sustentabilidade ambiental.
As medidas até agora previstas são ainda incipientes e o caminho para esta nova transição energética ainda é longo; entretanto, a adoção de mecanismos ousados poderia trazer uma solução para o problema mais rapidamente. Neste cenário, urge estruturar projetos que incentivem os indivíduos a adotarem medidas, no âmbito da execução de contratos públicos, que gerem externalidades positivas capazes de ajudar na roda da nova transição energética.
Danielle Franco É mestranda em Direito Público pela Fundação Getúlio Vargas, especialista em Direito Administrativo e coordenadora do núcleo de direito administrativo do GVM Advogados.
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