O desvalorização do minério de ferroque afeta todo o setor mundial, somou-se a questões locais e políticas que fizeram a empresa teve um desempenho pior do que os concorrentes internacionais este ano. De janeiro até ontem, ações caíram 17,27%mesmo após a empresa apresentar aumento na produção e aumento de mais de 200% no lucro no segundo trimestre.
De acordo com o Valor 360, oito em cada 11 analistas recomendam a compra das ações. O restante permanece neutro e ninguém recomenda a venda das ações. Para especialistas, o potencial médio de valorização do ativo é de quase 39%, atingindo R$ 82,30, pouco abaixo do seu recorde.
Mas, para voltar aos tempos de glória, a mineradora precisa superar questões como:
- Perguntas sobre o sucessão do seu então presidente Eduardo Bartolomeu;
- Reparações devidas em caso de desastre em Mariana (MG) em 2015, ainda em negociação;
- Crise imobiliária na China que derruba demanda e preço do minério de ferroPrincipal produto da Vale;
- Problemas com o renovação de concessões ferroviárias.
O primeiro fator de risco foi deixado de lado esta semana, após Gustavo Pimenta sendo eleito presidente por unanimidade do Conselho de Administração. O nome foi bem recebido pelo mercadoque temiam a interferência do governo caso um político ocupasse a cadeira.
Atual vice-presidente executivo de Finanças e Relações com Investidores da empresa, é visto como um nome técnico que dará continuidade aos projetos iniciados pelo seu antecessor.
“A substituição interna (por executivo da empresa) é a melhor alternativa para a Vale pelos seguintes motivos: facilita a transição e limita mudanças na estratégia da empresa, não interrompe processos de negociação em andamento sobre temas importantes”, diz o relatório da Itaú BBA.
No início do ano, a mineradora passou por um momento de enorme estresse, quando circularam rumores de que Guido Mantegaex-ministro de Dilma Rousseff, seria o novo nome à frente da empresa. Mesmo que o fato tenha sido negado, as incertezas ainda permaneciam.
Em março, outro barulho. O conselheiro José Luciano Duarte Penido renunciou ao cargo e acusou o processo de sucessão de ser manipulado. Depois, ele voltou, mas os jornais sofreram um revés.
Um dia após a escolha de Pimenta, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a criticar as privatizações e exigiu o dinheiro que a empresa deverá pagar pelo desastre de Mariana, ocorrido em novembro de 2015.
“”A Vale, que tinha conselho de administração, eu sabia quem era o presidente da Vale, nós sabíamos quem ele era. Hoje nessa discussão estamos prestes a fazer um acordo para receber o dinheiro da Mariana [cidade de Minas Gerais]o dinheiro que vamos receber, o dinheiro que prometeram ao povo, vocês não têm dono”, afirmou o Presidente da República.
De acordo com o banco Goldman Sachso executivo é a melhor escolha que o conselho da Vale poderia fazer na sucessão à presidência da empresa porque alinha diversos interesses em torno da mineradora.
De acordo com Felipe Abade, gerente de Pólo Capital, Pepper demonstra ter um perfil conciliador, que tem tudo para manter um bom relacionamento com os políticos. O especialista afirma que as administrações petistas tendem a exigir mais investimentos das empresas extrativas e a mineradora tem ferramentas para atender a essas demandas. A Vale tem vários projetos que são interessantes para o governo e rentáveis para os investidores, só precisam sair do papel.
“Ele viaja bem por Brasília, Minas e Pará. Agora, precisa ser proativo para apresentar projetos de interesse comum. mostrar que possui excelentes ativos, que fazem parte da nova matriz energética, como o cobre. Caso sejam necessárias mais licenças, o governo pode estar disposto a realizar o projeto do cobre, o que é bom para o país e para os acionistas”, avalia.
O segundo grande obstáculo (indenização ainda pendente pelo desastre de Mariana) tem sido um dos fatores de risco mais debatidos no mercado, tanto do ponto de vista dos recursos financeiros como da forma como a empresa opera. Em prol do ambiente e dos lucros, é necessário garantir que novas tragédias sejam evitadas.
Quase dez anos depois, o acordo de reparação do desastre de Mariana (MG) ainda está em negociação. No entanto, de acordo com Abad, Essas incertezas estão prestes a chegar ao fim nos próximos meses.
“Precisamos virar essa página. Desde o desastre, quando os analistas se reúnem, o foco está nesses problemas. Paramos de discutir projetos. É algo que precisa ser deixado para trás. O provisionamento da empresa provavelmente já foi incorporado pelo mercado”, diz o gerente.
Ilan Arbetmananalista de ações na equipe de análise da Ativaentenda isso o acordo deve ficar num meio-termo entre o que o governo quer, que seriam R$ 164 bilhões pagos em 12 anos, e a proposta dos representantes da Samarco, de R$ 140 bilhões pagos em 20 anos.
“Sabendo quem é o novo presidente e sem o fator Mariana, a Vale fica mais livre para seguir seu próprio caminho daqui para frente”, afirma.
Ele observa que Mariana e Brumadinho foram tragédias gravíssimas que pesaram sobre a empresa. “Mariana tem um agravante que é o Rio Doce. Ao longo dos anos, vimos esse passivo piorar. A lição que fica clara é que não dá para crescer a qualquer custo e hoje a parte qualitativa fala mais alto que a quantitativa”, comenta.
O analista afirma que, Além do seu carro-chefe, que é o minério de ferro, a Vale possui ativos de qualidade, como cobre e níquel. Esses metais são fontes de diversificação de renda da empresa que, assim como outras mineradoras, sofre com a queda no preço das matérias-primas.
Minério de ferro e China
Os investimentos na exploração de cobre e níquel podem ajudar a amenizar, mesmo que marginalmente, o buraco deixado pelo terceiro impasse na valorização das ações da Vale: a queda no preço do minério de ferro. A crise da demanda por metais é talvez a única dificuldade que não depende da gestão das empresas para ser superada.
Segundo Abad, da Polo Capital, os microproblemas parecem estar a ser resolvidos, o que seria positivo para as unidades populacionais. “Porém, o mais importante de tudo é o preço do minério de ferro, que vem caindo muitodevido a problemas de demanda na China, principalmente no mercado imobiliário que não está se recuperando”, afirma.
A China é o maior importador de minério de ferro do mundo. A commodity é utilizada na fabricação de aço, muito procurado na construção civil. Mas mesmo com o estímulo do governo chinês, o setor imobiliário ainda está em dificuldades, acumulando falências de gigantes como Evergrande.
O gestor enfatiza que, No curto prazo, a procura por metais deverá permanecer fraca. Para Abad, mesmo que outros mercados estejam em crescimento, como a Índia, será difícil compensar uma possível queda na China.
Arbetman, analista da Ativa, afirma que A China não deverá mais ter as taxas de crescimento económico que tinha há duas décadas, sempre acima dos dois dígitos. “Agora será um crescimento mais modesto. Além disso, cada vez mais, o país quer deixar de ser uma economia baseada em setores tradicionais como imobiliário e infraestrutura, abrindo espaço para a tecnologia, e essa mudança prejudica os negócios da Vale“, diz.
Porém, as ações da mineradora brasileira perdem atratividade. Embora o preço do minério de ferro esteja caindo, sendo negociado em torno de US$ 100 a tonelada, continua trazendo vantagens ao fluxo de caixa da Vale.
Para manter sua estabilidade financeira (o chamado ponto de equilíbrio no jargão empresarial), o metal precisa ser vendido acima de US$ 70explica Arbetman.
Em momentos específicos, os investidores poderão observar avanços nas ações, como aconteceu nesta semana, quando os estoques de minério de ferro nos portos chineses caíram e elevaram o preço do minério de ferro. No entanto, isso não indica necessariamente uma tendência ascendente na commodity.
As ferrovias são o principal meio de escoamento da produção da Valemas um impasse quanto à renovação das concessões também entrou na balança de risco dos analistas.
Num relatório, o Itaú BBA destaca que o novo presidente precisa de procurar um acordo sobre concessões ferroviárias, a fim de equilibrar potenciais pagamentos com obrigações futuras, para alcançar uma situação “ganha-ganha”.
Na opinião de Abad, o governo está interessado nas concessões ferroviárias e deveria acelerar o processo.
O gestor conclui ainda que, Numa comparação relativa com suas concorrentes australianas, BHP e Rio Tinto, as ações da Vale tendem a ter melhor desempenho quando conseguir resolver imbróglios locais e internos. Afinal, esses fatores deixaram a mineradora brasileira mais descontada que as demais.
“Isso não significa que as ações da Vale vão subir, mas talvez caiam menos que as outras. Em última análise, a crise de procura da China é um mau sinal para os mineiros“, diz.
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