Já se passaram quase 25 anos desde que o distrito tentou se tornar uma cidade. A Assembleia Legislativa de Mato Grosso criou o município em março de 2000. Mas uma ação judicial de um município vizinho bloqueou o processo de emancipação. Boa Esperança do Norte, no Mato Grosso, terá suas primeiras eleições municipais. Faltam exatos 19 dias para as eleições municipais. É natural que esse encontro com as urnas cause alguma ansiedade, principalmente entre os brasileiros mais jovens, aqueles que votam pela primeira vez. Mas há um lugar, no coração do Brasil, onde esta excitação pela primeira votação contagiou todos os eleitores. Um cantão do Brasil que tem mais plantações do que casas. Colheita até onde a vista alcança. Apenas um grupo de emas se destaca na vastidão. Se Boa Esperança do Norte fosse um livro, as páginas ainda estariam em branco. A história começaria a ser escrita em 1º de janeiro de 2025, data da posse do prefeito, do vice-prefeito e de nove vereadores – a primeira na história do município. Já se passaram quase 25 anos desde que o distrito tentou se tornar uma cidade. A Assembleia Legislativa de Mato Grosso criou o município em março de 2000. Mas uma ação judicial de um município vizinho bloqueou o processo de emancipação. Nova Ubiratã não queria perder um pedaço de terra. Boa Esperança do Norte (MT) se prepara para ser o mais jovem dos municípios brasileiros Jornal Nacional/ Reprodução Após longa batalha jurídica, a emancipação foi confirmada em outubro de 2023, por decisão do STF – Supremo Tribunal Federal. Agora, Boa Esperança do Norte se prepara para ser o mais jovem dos municípios brasileiros. “Sou de Sarandi, no Rio Grande do Sul. Moramos aqui há 37 anos. Vim com minha esposa e três filhos”, conta o produtor rural Moacir Zanatta. Repórter: Quando você chegou aqui, o que tinha nesse bairro? Moacir: Não teve nada. Eram onze famílias. E trabalhávamos como ensacadores, coletores de raízes. O que apareceu, nós fizemos. Porque chegamos aqui com pouco dinheiro. Repórter: E hoje, na sua terra, o que você planta? Moacir: Plantamos soja, milho, temos pecuária. Repórter: Quero ver essa fazenda. Leve-me lá? “Havia água, mas era precária. A luz era movida por motores. Depois chegou a energia, chegou o telefone, chegou o asfalto”, diz Joelso Eugênio Zanatta, filho de Moacir. Repórter: Aqui na fazenda você tem alguma relíquia? Está certo? Moacir: Ah, sim. Essa é a relíquia que iniciamos no Mato Grosso. Repórter: Quando você olha tudo isso aqui, o que você sente? Moacir: Sinto muito orgulho. Muita alegria. Boa Esperança do Norte: a terra já produz quase 4 milhões de toneladas de algodão, soja e milho por ano Jornal Nacional/ Reprodução Boa Esperança do Norte fica a mais de 350 km de Cuiabá. Basta uma rápida pesquisa na internet para encontrar informações básicas sobre Boa Esperança do Norte, já com características de município. Vemos, por exemplo, dados sobre a área. Boa Esperança do Norte possui aproximadamente 4.700 km². A população estimada é de cerca de 9 mil habitantes. E a atividade principal, como tudo na região, gira em torno do agronegócio. Boa Esperança do Norte é muito mais que um ponto no mapa. As terras já produzem quase 4 milhões de toneladas de algodão, soja e milho por ano. Eles têm 470 empresas. O novo mapa ficará assim: 80% das terras vieram de Nova Ubiratã; e 20%, do município de Sorriso, responsável pela gestão de Boa Esperança até 31 de dezembro de 2024. “A criação de um município é como o nascimento de um filho. Envolve alegria, expectativa, mas muita responsabilidade”, afirma Edilene Lôbo, ministra do Tribunal Superior Eleitoral. Durante três dias, o Jornal Nacional visitou a região. Estava fora de temporada. O céu vermelho: sinal de que a fumaça das fogueiras já chegou lá. O produtor rural Adão Gonçalves possui uma pequena propriedade. Ele ganhou o lote em um assentamento de reforma agrária há 24 anos. Ele e o filho fazem de tudo um pouco para aumentar a renda, que ainda é pequena. “Fazemos salame, vendemos ovos, vendemos frango caipira, querido. Ainda precisa de muito. Falta muita coisa”, diz ele. O mecânico Cleison Oliveira de Souza e a dona de casa Estefani Tayana de Souza estão em Boa Esperança há 10 anos. Eles têm três filhos. “Esperamos que dê um impulso. Que seja, como você diz, um começo avassalador”, afirma Cleison. José, o filho mais velho, é autista. Repórter: Quando você precisa de algo mais urgente, mais complexo, o que você faz? Cleison: Procuramos recursos lá fora, porque aqui não temos muitos recursos. Estefani: Na cidade grande tem neuro, terapias para ele. E espero que sim, para que o desenvolvimento dele melhore. Moradores dizem que a sede administrativa de Sorriso fica muito longe de Boa Esperança. Este foi um dos principais argumentos para a emancipação. “Não temos especialistas, como um obstetra. Então, tem que seguir em direção a Sorriso, que fica a 130 km daqui”, afirma a enfermeira Simoni Hartmann. Estar próximo dos moradores é tarefa da administração municipal. “A educação pública, a educação infantil e o ensino fundamental são basicamente funções das prefeituras. No Sistema Único de Saúde, o primeiro atendimento, o atendimento direto à população, é realizado nos postos de saúde e hospitais municipais. O transporte público local de passageiros é fundamental, é responsabilidade também dos municípios”, afirma Gustavo Binenbojm, professor de Direito – UERJ. Mas a cada novo município é criada uma nova estrutura da máquina pública – com prefeitura, câmara de vereadores, novos posições. “Quando a criação do município é legítima por uma reivindicação popular correta e sincera, é um custo inerente à democracia. É mau quando a criação do município serve apenas interesses eleitorais e paroquiais, aumentando despesas sem contrapartida em serviços à população”, afirma Gustavo Binenbojm. Com Boa Esperança do Norte no mapa, o Brasil terá 5.569 municípios – 75% deles dependem de recursos federais, do Fundo de Participação Municipal, para se sustentarem. “Temos sérias restrições orçamentárias para a maioria dos municípios brasileiros. A mensagem para os prefeitos que estão assumindo agora é: é preciso ter responsabilidade fiscal, tentar melhorar a poupança dos seus municípios e assim garantir investimentos para as suas cidades”, afirma Jeconias Junior, da Frente Nacional de Prefeitos e Prefeitas. “Votar é poder. Votar é uma oportunidade de decidir, de escolher. Então, o voto tem um potencial fundamental para provocar transformação nas cidades”, afirma a ministra Edilene Lôbo. “Não estou vendendo meu voto. Não vendo. Não tenho educação, nem sei assinar meu nome. Se você for candidato a prefeito ou vereador e pedir voto, eu não me venderia por dinheiro nenhum”, afirma Raimundo Nonato, autônomo. “As eleições autárquicas são de fundamental relevância para o aumento da democracia ao nível mais básico, que é a relação direta possível entre autarcas e vereadores e os cidadãos. É aqui que a democracia é mais visível. E o seu sucesso é fundamental para melhorar a qualidade da democracia praticada no país”, afirma Gustavo Binenbojm. Repórter: O que você acha que vai acontecer lá no dia da votação, em frente às urnas? Você acha que vai tremer na base? O que você acha? Joelso Eugênio Zanatta: Sempre treme. É diferente, algo que nunca aconteceu. É uma emoção muito grande. Repórter: Você já percebeu que carrega um dos primeiros cidadãos de Boa Esperança do Norte? Simone: Não houve. Repórter: Seu filho ou filha e a cidade crescerão juntos? Simone: É por isso que também estamos preocupados com este lugar. Que seja um lugar promissor. “Vejo esse novo município, essa criança, essa página em branco, podendo trazer mais esperança ao Brasil, como o próprio nome diz”, afirma a ministra Edilene Lôbo. O horizonte não está mais distante. Os moradores já podem se ver nos primeiros capítulos do livro do mais novo município do Brasil.
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