O mantra do “crescimento”, amplamente adotado pelo mercado financeiro, ignorou deliberadamente os limites impostos pelo planeta e as consequências sociais de uma economia que coloca o lucro acima de tudo Getty Images Vivemos imersos em um sistema econômico que, durante décadas, promoveu a ideia que o crescimento económico contínuo seria a chave para o progresso humano. O mantra do “crescimento”, amplamente adotado pelo mercado financeiro, ignorou deliberadamente os limites impostos pelo planeta e as consequências sociais de uma economia que coloca o lucro acima de tudo. Esta visão míope baseia-se na crença de que os recursos naturais e humanos são infinitos ou pelo menos suficientemente disponíveis para alimentar um sistema que valoriza o curto prazo em detrimento da sustentabilidade a longo prazo. Esta lógica não conseguiu reconhecer que o planeta tem limites claros. O colapso climático, a escassez de água, a perda de biodiversidade e a degradação dos ecossistemas são sintomas de um sistema económico que se recusa a adaptar-se às realidades físicas e biológicas do mundo. Contudo, o impacto não é apenas ambiental. As consequências deste modelo são profundamente sentidas nas desigualdades sociais e na exclusão de uma parte significativa da população do acesso aos benefícios gerados pelo crescimento. O mercado financeiro, em particular, é um dos pilares deste modelo insustentável. Originalmente concebido como um mecanismo para alocar recursos de forma eficiente, transformou-se num instrumento para concentrar riqueza e perpetuar desigualdades. Ao concentrar-se na maximização dos retornos a curto prazo, o mercado ignora sistematicamente as externalidades – os custos sociais e ambientais das suas atividades. As empresas que destroem florestas, poluem os oceanos ou exploram mão-de-obra barata são recompensadas, enquanto aquelas que tentam operar de forma sustentável enfrentam obstáculos e custos adicionais. Esta busca incessante pelo lucro não só corrói o tecido social, mas também enfraquece a própria democracia. Quando o capital está concentrado nas mãos de poucos, começa a controlar as narrativas, as políticas públicas e, eventualmente, o próprio futuro da sociedade. Este poder desproporcional permite que as grandes empresas influenciem leis e regulamentos, garantindo que os seus interesses sejam protegidos, enquanto as exigências da maioria são ignoradas. O fosso entre ricos e pobres está a aumentar a um ritmo alarmante. Os 1% mais ricos detêm uma parcela desproporcional da riqueza global, enquanto os restantes lutam para sobreviver num sistema que os marginaliza. Como bem apontou Stiglitz, “o 1% mais rico tem as melhores casas, a melhor educação, os melhores médicos e os melhores estilos de vida, mas há uma coisa que o dinheiro parece não ter comprado: a compreensão de que o seu destino está ligado a como vivem os outros 99%.” Este descompasso entre o topo da pirâmide e a base é perigoso. Quando grandes massas de pessoas são excluídas dos benefícios do crescimento, a coesão social enfraquece e a estabilidade política é ameaçada. As desigualdades extremas geram ressentimento, instabilidade e um ciclo vicioso de pobreza e exclusão. Ao mesmo tempo, os que estão no topo acreditam que estão isolados das consequências, vivendo em bolhas financeiras e sociais que apenas os protegem temporariamente da realidade. Se o mercado financeiro quiser permanecer relevante no futuro, terá de passar por uma mudança radical. transformação Isto não significa deixar de perseguir o lucro, mas sim abandonar a lógica do lucro a qualquer custo e adoptar uma nova visão, que integre o bem-estar social e a sustentabilidade ambiental como métricas centrais de sucesso. alternativa Em vez de extrair valor das comunidades e dos ecossistemas, o financiamento regenerativo propõe que o capital seja utilizado para restaurar e revitalizar. Esta nova abordagem exige uma mudança de mentalidade entre investidores e empresas. Já não basta adotar políticas ESG como forma de mitigação de riscos. A mudança que importa é que o mundo corporativo e o mercado financeiro integrem um modelo que inclua os stakeholders na estratégia do negócio, sendo a sustentabilidade e a equidade consideradas desde o início. Além disso, é crucial que os investidores assumam um papel mais ativo na gestão, pressionando as empresas e os fundos em que investem a adotarem modelos mais éticos e justos. Este é o momento de repensar a forma como medimos o sucesso económico. O Produto Interno Bruto (PIB), a métrica mais utilizada, é limitado na sua capacidade de reflectir o bem-estar da população ou a saúde dos ecossistemas. Mede apenas o valor monetário dos bens e serviços produzidos, sem considerar os custos sociais e ambientais. Precisamos de novas métricas que levem em conta a qualidade de vida, a justiça social e a sustentabilidade ambiental. Sem estas novas ferramentas, permaneceremos presos num ciclo de crescimento insustentável e destruição contínua. No entanto, a mudança necessária vai além das métricas. Precisamos de reimaginar o papel do capital e da economia como um todo. O crescimento económico por si só não é um objectivo válido se for alcançado à custa do planeta e das pessoas. Devemos abandonar uma economia extractiva, que vê a natureza e os seres humanos como recursos a serem explorados, e avançar para uma economia regenerativa, que respeite os limites do planeta e promova o bem-estar de todos. O caminho para esta transformação não será fácil, mas é essencial. Continuar no modelo atual nos levará a um colapso ambiental e social. A mudança exigirá coragem para desafiar o status quo e abraçar uma nova ética do capital. O mercado financeiro pode e deve ser um aliado na construção de um futuro mais justo, inclusivo e sustentável, mas isso só será possível se abandonarmos a lógica destrutiva que atualmente o norteia. Parafraseando Partha Dagupta, estamos todos no mesmo barco, mas alguns insistem em perfurar o casco. O planeta é finito e a nossa resiliência ecológica está a esgotar-se rapidamente. A ideia de que a tecnologia ou as novas fronteiras nos salvarão é uma aposta perigosa, que coloca em risco não só o futuro da humanidade, mas o próprio equilíbrio da vida na Terra. A responsabilidade não cabe apenas aos governos ou às empresas, mas a todos nós. Precisamos de pressionar pela mudança, exigir que o mercado financeiro adopte uma nova ética de capital e investir em modelos de negócio que promovam a regeneração e não a destruição. O tempo está a esgotar-se e a escolha é clara: continuar no actual caminho rumo à catástrofe ou construir algo novo, onde o capital sirva o bem comum e promova a prosperidade para todos. É hora de parar de perfurar o casco. *Fabio Alperowitch é casado, pai de cinco filhos. Fundou a re.capital fama em 1993, aos 21 anos. Em 2014, foi selecionado entre os 99 melhores investidores do mundo pela publicação “Os 99 maiores investidores do mundo: o segredo do sucesso”, organizada por Magnus Angenfelt. Durante sua carreira, participou da fundação de quatro ONGs. Atualmente é conselheiro de diversas instituições do terceiro setor: WWF-Brasil, Instituto Ethos, Pacto pela Igualdade Racial, Instituto LIFE, Instituto Brasil Israel, Museu Judaico de São Paulo, Instituto Totós da Teté e Instituto FAMA. Mais lido
fazer empréstimo no bolsa família online
como quitar empréstimo consignado
refin o que é
refinanciar emprestimo
empréstimo consignado funcionário público
aposentado emprestimo caixa
empréstimo para militar
empréstimo consignado pan
0