Comer carne bovina para o argentino vai além do ato de comer e nutrir-se. É praticamente uma questão de honra.
O infame “assar”(churrasco) – que ganhou fama graças a um grande rebanho composto, segundo informações de 2023 do Ministério da Economia do país, por mais de 54 milhões de cabeças de gado, em sua maioria das raças British Hereford e Aberdeen Angles –, é um dos pilares da Cultura gastronômica argentinaque também é acompanhada pela “hierba mate” – saboreada em uma infusão coberta pela cabaça e sorvida pela bomba de metal e que todo (sim, todo) cidadão adulto argentino leva de um lado para o outro, seja na privacidade de sua casa ou na travessia uma das “calles” de suas cidades.
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Então, quando o Bolsa Comercial de Rosário divulgou, no início de julho, uma projeção apontando que, até o final de 2024, o consumo médio anual da carne na Argentina é estimada em 44,8 kg por habitante – o menor valor per capita desde 1914 – criou-se uma comoção.
O grande vilão desta história é o galope inflaçãoque devasta o poder de compra da classe média e das classes menos abastadas do país, ou seja, da grande maioria dos argentinos – e, aqui, vale dizer que o índice de pobreza chega a 60% da população, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística e Censos (Indec).
Oficialmente, a inflação anual é de 263,4%, segundo divulgação mais recente do Indec, em meados de agosto. Mas, nas ruas, isto é, nos mercados chineses (que dominam o comércio de produtos essenciais nos bairros), supermercados, talhos e restaurantes Buenos Airesesse número não é necessariamente uma realidade, mesmo que amarga. É pior, principalmente no caso dos trabalhadores, que têm o agravamento dos seus salários por não acompanharem a força e a velocidade com que esse “dragão faminto” sobrevoa a capital argentina.
O microempreendedor Oscar Zoanni, dono de uma loja de materiais de construção em um bairro nobre da capital federal, diz que fazia “churrasco” toda semana. “Mas agora faço isso uma vez por mês, no máximo.”
Ele conta que seu tradicional churrasco semanal contava com “chouriço (salsicha), morcila (chouriço) vacio (fralda), lomo (filé migon), bondiola (um corte de carne de porco) e pedaços de frango”. Com a forte alta dos preços da carne bovina — de dezembro de 2023 a julho deste ano, a inflação de alimentos e bebidas não alcoólicas subiu 76% —, seu churrasco ocasional agora só contém linguiça e pedaços de porco e frango, que são as carnes mais baratas. “De vez em quando me atrevo a comprar fralda.”
Comer fora? Impraticável
Comer em uma churrasqueira, de jeito nenhum, diz Zoanni. “Os preços dos restaurantes são inacessíveis.”
Pablo Rivero, dono da famosa e estrelada (pelo Guia Michelin) parrilla Dom Júlioem Palermo, diz que não aumenta os preços de seu cardápio, que conta com cortes nobres de carne bovina, há cerca de três meses.
“A demanda caiu, mas como não aumentamos os preços, essa redução não foi muito significativa. E, quando alteramos os preços, o aumento fica sempre abaixo da inflação”, afirma Rivero.
Ele explica que seus restaurantes, Don Julio e El Preferido de Palermoconseguem manter os preços do cardápio contidos por mais tempo porque, como a família produz gado na própria fazenda, fica mais fácil controlar os preços dos pratos, apesar das duas casas também trabalharem com fornecedores terceirizados.
Não são só os argentinos que sentem o aumento da carne no bolso. Segundo Rivero, percebeu-se uma leve queda no fluxo de brasileiros, por exemplo, movimento que “foi compensado pelo aumento de turistas de outros países, principalmente americanos”.
No dia 17, o público do El Preferido foi maioritariamente de turistas, com algumas mesas a receberem argentinos. Um cardápio para três pessoas, com dois pratos mais vinho (meia garrafa), sobremesa e café custa cerca de R$ 700 pelo câmbio paralelo (139,6 mil pesos). No Don Julio, o cardápio para uma pessoa com entrada (“Salchicha Parrillera”) e prato de Ojo de Bife custa cerca de R$ 360 (82.450 pesos) —sem bebidas e sobremesa.
É interessante notar que, em 2023, em qualquer época do ano, conseguir uma reserva no Don Julio era uma saga e exigia muita paciência, pois era preciso esperar de quatro a cinco meses por uma mesa. Porém, em julho deste ano foi possível reservar vagas para o mesmo mês.
Na churrascaria Desnivel, uma das mais tradicionais e badaladas do bairro turístico de San Telmo, o movimento caiu quase pela metade em relação à segunda quinzena de julho, segundo Diego, gerente matinal.
Ele observa que o fluxo de turistas, inclusive brasileiros, caiu em julho, em comparação com outros anos, e atribui essa queda a uma crise geral que o turismo argentino enfrenta, causada pela “inflação real”..
“Para minimizar esse efeito, aqui na Desnivel não repassamos toda a inflação para o cardápio. Faz quatro meses que não aumentamos os preços”, diz o gerente, um tanto desanimado com a queda na receita.
Na porta da churrascaria, que oferece uma “parrillada” para quatro pessoas por 90 mil pesos (cerca de R$ 400), praticamente não havia fila no primeiro domingo de agosto, enquanto, num domingo de dezembro de 2023, para conseguir uma mesa no lugar foi necessário esperar pelo menos uma hora.
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