Pelo menos 42 mil candidatos no eleições municipais Este ano mudaram a declaração de cor e raça que deram na última eleição, em 2020. A mudança atinge um em cada quatro (24%) candidatos que disputaram as últimas eleições municipais e estão participando da disputa de 2024.
Esses candidatos com novas autodeclarações representam 9,3% de todas as 454 mil candidaturas que foram inscritas para a disputa de 2024 e agregadas ao sistema do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) até as 16h30 desta sexta-feira (16).
Os números ainda podem oscilar, pois as inscrições que foram feitas presencialmente ainda estão sendo adicionadas à plataforma.
A maioria das mudanças veio de candidatos que se identificaram como branco em 2020 e agora eles se declaram marrom. Esse grupo representa 40,4% de todos que alteraram o registro da raça – em números absolutos, são 16,9 mil.
Esse tipo de alteração no cadastro étnico-racial da Justiça Eleitoral dá ao candidato o direito de aproveitar o cotas eleitorais para candidatos negros.
Segue o movimento inverso, de pardos para brancos, com 27,6% de mudança de pardos para brancos (11,5 mil).
Outros 14,8% registraram mudança de pardo para preto (6.221) e outros 11,2% de preto para pardo (4.729). Ambas as mudanças não têm efeito prático na distribuição dos recursos do fundo eleitoral, já que a regra inclui negros e pardos como negros.
Para a análise, o relatório considerou apenas candidatos que concorreram em 2020 e concorrem novamente em 2024 e que divulgaram informações sobre raça em suas inscrições nos dois anos.
Proporcionalmente ao número de candidatos que concorreram em 2020 e retornaram em 2024, a Mobiliza Nacional é o partido que mais teve candidatos que mudaram a autodeclaração: 30,2%. Em números absolutos, esta parcela representa 576 nomes.
As maiores movimentações dos candidatos da Mobiliza foram de brancos para pardos (35,2%) e pardos para brancos (29,7%).
Em números absolutos, o partido que mais teve candidatos com mudanças raciais foi o MDB, com 4.324 mudanças. Este valor representa 22,3% de todos os inscritos no partido que concorreram nas últimas eleições, em 2020, e que agora regressam à disputa em 2024.
Por estado, as maiores mudanças estão em Paraíbaonde 32,4% dos inscritos registraram alterações na autodeclaração para a disputa em 2024. Segundo dados do IBGE, o estado é majoritariamente formado por pardos (55,5%), seguidos por brancos (35,72%) e negros (7,96%). Amarelos e indígenas respondem por 0,7%.
Doutor em ciência política, professor da UFBA (Universidade Federal da Bahia) e membro da Abrapel (Associação Brasileira de Pesquisadores Eleitorais) Cloves Oliveira destaca que desde os anos 2000 a classificação racial se tornou critério fundamental no acesso às políticas públicas.
“Não é algo subjetivo se classificar como preto, pardo, branco, indígena ou quilombola no Brasil hoje. Isso significa uma disputa por recursos e é nesse sentido que todos os debates que estão em pauta sobre até que ponto essas as classificações raciais retratam a identidade social dessas pessoas”.
Para Oliveira, enquanto a mudança da autodeclaração do branco para o pardo indica afroconveniência, a mudança do pardo para o preto significa um “ajuste de conduta para evitar danos de condenação pública por ter declarado uma cor que não é reconhecida socialmente”. A mudança do marrom para o preto aponta para a afirmação da identidade política.
Professor da UnB e um dos autores do livro “Raça e Eleições no Brasil”, Carlos Machado tem uma interpretação diferente da autodeclaração. Para ele, as informações sobre raça são subjetivas e podem ser alteradas tanto pelo reconhecimento de uma identidade, por pressão de grupo ou também em busca de algum tipo de ganho.
“O fato de a maior parte dessas mudanças ocorrer de brancos para pardos indica que existe esse possível viés de algum tipo de ganho eleitoral, mas ainda é importante ressaltar que há pardos se identificando com brancos, ou seja, há um processo isso não é em uma direção.”
Machado diz ainda que é questionável a leitura de que a mudança visa o acesso aos recursos, pois a distribuição não tem sido cumprida pelos partidos.
Na última quinta-feira (15), o Senado aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) chamada PEC da Anistia, que, entre outros pontos, revoga a determinação de que negros devem receber recursos eleitorais proporcionalmente ao número de candidatos, segundo decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) válido desde 2020.
Na disputa de 2022, por exemplo, pretos e pardos deveriam ter recebido 50% do orçamento eleitoral de R$ 5 bilhões, mas a determinação foi amplamente ignorada pelos partidos.
Com a PEC, os partidos devem investir 30% de seus recursos em candidatos negros – ou seja, reduz o percentual de cerca de 50% para 30%.
Para as demais eleições, o projeto diz que os partidos que descumpriram a cota racial em 2020 e 2022 poderão compensar essa distorção nas quatro disputas seguintes, a partir de 2026, escapando assim da punição.
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